Quinta-Feira, 25 de Abril de 2024
Besouro da cana-de-açúcar (Migdolus fryanus )

O besouro Migdolus fryanus (West., 1863) (Coleoptera: Cerambycidae) é conhecido por sua grande capacidade destrutiva. Os danos são provocados por suas larvas, que se alimentam e destroem o sistema radicular de pelo menos dez famílias de plantas. O controle é extremamente difícil, pois essas larvas podem atingir grandes profundidades. O Centro-Sul do Brasil é a região mais afetada e, aparentemente, seu centro de origem.

Hospedeiros: diversas espécies de plantas de pelo menos dez famílias são mencionadas como hospedeira de Migdolus spp. Essas plantas são utilizadas exclusivamente como fonte de alimento pelas larvas, uma vez que os adultos não se alimentam, tampouco as fêmeas ovipositam nelas. As principais culturas relacionadas com perdas econômicas em razão do ataque por Migdolus spp. são cana-de-açúcar, amoreira, eucalipto, Pinus, café, videira e feijão.

Danos e sintomas: os danos são provocados pelas larvas de Migdolus spp., que se alimentam e destroem o sistema radicular das plantas em qualquer idade. Com isso, pode haver grande redução na absorção de água e nutrientes pelas plantas, levando-as ao secamento e morte. Quando em baixa população, as larvas desse besouro são encontradas geralmente em reboleiras e predominantemente em solos de textura arenosa. Em cana-de-açúcar, as larvas de Migdolus spp. atacam o sistema radicular, danificando tanto raízes em maior profundidade como as mais superficiais, podendo destruí-las totalmente. Geralmente, atacam os internódios basais dos colmos, localizados abaixo do nível do solo (erroneamente denominados rizoma da cana), escavando galerias e reduzindo as reservas que serão utilizadas pelas soqueiras no ano seguinte, debilitando as plantas e limitando a longevidade dos canaviais. Em alguns casos, podem atingir também os internódios basais acima do nível do solo. Em canaviais mais velhos, as touceiras atacadas apresentam aspecto de canas afetadas por seca ou fogo.
Os efeitos são mais evidentes durante os períodos mais frios e secos do ano (inverno na região Centro-Sul do Brasil), quando as plantas estão mais sujeitas a déficit hídrico, sendo possível encontrar elevado número de larvas junto às touceiras atacadas. Nos locais de alta infestação, é possível que haja necessidade de replantio ou reforma das áreas afetadas já no primeiro ano. Levando-se em consideração que em cana-de-açúcar podem-se atingir quatro ou mais cortes numa mesma área sem necessidade de novo plantio e, ainda assim, haver retorno econômico, a reforma da área seguida de novo plantio representa uma perda considerável, visto que envolve a alocação de máquinas, insumos e mão-de-obra. Nesse caso, os custos de produção se tornam ainda mais elevados, e os ganhos finais, reduzidos.

Biologia

São conhecidas dez espécies de Migdolus, porém nove delas são besouros com acentuado dimorfismo sexual. Os machos possuem coloração preta (maioria), castanho-escura ou castanho-avermelhada e medem entre 12 e 37 mm. As fêmeas, por sua vez, são de coloração castanho-avermelhada (maioria) ou castanho-escura e medem entre 19 e 35 mm.

M. fryanus é um inseto de metamorfose completa (holometabólica) que passa por quatro estágios: ovo, larva, pupa e adulto.

  • Ovos: são brancos, colocados em diversas profundidades no solo. A eclosão das larvas ocorre cerca de 21 dias, em média, após a oviposição.
  • Larvas: quando recém-eclodidas, aparentemente se alimentam apenas de matéria orgânica, ao passo que nos estádios mais avançados se nutrem do sistema radicular das plantas. No final do desenvolvimento, as larvas podem medir até 60 mm de comprimento. Durante a fase larval, que corresponde ao maior período de vida desse inseto, ocorrem as maiores movimentações no solo, tanto horizontalmente quanto verticalmente, graças a sua mobilidade, podendo atingir profundidades de até 5 m e deixando inúmeras galerias no solo.
    Levantamentos conduzidos na região Sudeste do Brasil sobre a dinâmica populacional de larvas de M. fryanus em diversas profundidades no solo, na cultura da cana-de-açúcar, demonstraram que as maiores concentrações de larvas nas camadas mais superficiais (0 a 30 cm) coincidiram como os meses mais frios e secos do ano, ou seja, entre maio e agosto. Durante os meses de novembro a março (período chuvoso), há uma diminuição nessa população, coincidindo com o aparecimento dos adultos para o acasalamento (revoada). Geralmente, a partir de fevereiro, há novamente um aumento no número de larvas nas camadas mais superficiais. Essa dinâmica populacional, no entanto, pode sofrer variações de região para região, de acordo com as condições edafoclimáticas e de manejo do solo.
    O ciclo completo de M. fryanus (ovo-adulto) tem a duração de dois anos, porém uma parcela da população pode completar o ciclo em três anos.
  • Adulto: tanto os machos quanto as fêmeas de Migdolus spp. não se alimentam e vivem à custa de suas reservas energéticas armazenadas durante a fase larval. Após o início das revoadas, os machos vivem cerca de cinco dias. As fêmeas geralmente são copuladas no primeiro dia em que surgem na superfície do solo, vivem, em média, 26 idas e colocam, em média, 34 ovos.

Comportamento reprodutivo

Os acasalamentos de Migdolus spp. são muito característicos e ocorrem em dias quentes e úmidos, precedidos por chuvas, entre os meses de novembro e março na região Centro-Sul do Brasil. Nos dias de acasalamento, os machos surgem na superfície antes do que as fêmeas, permanecendo nas vegetações rasteiras, nas folhas e ramos da cultura ou sobre o próprio solo. Quando as fêmeas aparecem, permanecem com a cabeça e o tórax discretamente expostos ou, em algum caso, caminham sobre a superfície. Atraídos pelo potente feromônio sexual liberado pela fêmea, o macho voa a baixa altitude, em direção contrária ao vento, e pousa próximo a ela. A partir daí, caminha sob forte excitabilidade, com vigorosos movimentos das antenas (cuja função é detectar o feromônio), até localizar sua parceira. Uma vez sobre a fêmea, com o auxílio das mandíbulas, que agem como uma pinça, o macho a segura e realiza a cópula. No caso de a fêmea estar somente com a cabeça e o tórax expostos, o macho também utiliza a mandíbula para retira-la do solo. Geralmente, nota-se mais de um macho disputando uma mesma fêmea, e múltiplas cópulas podem ocorrer no curto espaço de tempo em que a fêmea permanece exposta. Após a cópula, a fêmea penetra imediatamente no solo, onde realizará a postura em diversas profundidades. Os acasalamentos, ou revoadas, como também são conhecidos, podem ocorrer durante vários dias consecutivos num mesmo local e normalmente numa mesma faixa de horário durante o dia, podendo variar de região para região em razão das condições climáticas. Na região Noroeste de São Paulo, as revoadas se iniciam por volta das 7 horas, com o aparecimento dos primeiros machos ativos, e terminam entre as 14 e 15 horas. O horário de pico, em que os manchos e as fêmeas estão mais ativos, ocorre entre as 10 e 11 horas, favorecido pelas condições ótimas de temperatura do ar e do solo para o acasalamento da espécie nessa região.

Importância econômica: os prejuízos econômicos são significativos para diversas culturas, notadamente para cana-de-açúcar, amoreira e eucalipto.

Ocorrência: espécies de Migdolus aparecem ter origem na região Centro-Sul da América do Sul. A coleta mais antiga de um exemplar de que se tem registro foi feita em 1845 por Castelnau na rota Goiás-Cuiabá. No Brasil, as espécies conhecidas de Migdolus estão distribuídas nos Estados de Goiás, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Paraná, Rondônia, Santa Catarina e São Paulo. Existem também relatos de ocorrência na província de Corrientes, na Argentina, e no Paraguai. Há também novas ocorrências de Migdolus em vários municípios no interior do Estado do Mato Grosso do Sul, principalmente em áreas de plantio da cana-de-açúcar, porém essas espécies ainda não foram identificadas. Acredita-se que as plantas nativas dos cerrados sejam os hospedeiros naturais desses insetos e que, após sua derrubada, especialmente para o plantio de monocultura, tenha favorecido sua adaptação e o aumento de usa densidade populacional.

Manejo: o manejo dessa praga baseia-se na adoção de um conjunto de medidas, como o mapeamento das áreas infestadas, inseticidas no sulco de plantio e a destruição de soqueiras. Pesquisadores e técnicos reconhecem que não existe um método único e eficiente para o controle de Migdolus spp., dadas as inúmeras dificuldades de atingir as fases biológicas desse inseto no solo. Portanto, um consenso parece indicar que todas as medidas de controle devem ser adotadas em conjunto ou isoladas, para resultar num manejo satisfatório dessa praga. Amostragem e nível de controle

O monitoramento de Migdolus spp. pode ser feito de três formas distintas, a primeira delas durante o levantamento regular de pragas de solo, antes da reforma dos canaviais. Geralmente, a amostragem é realizada, no mínimo, em duas trincheiras por hectare, com dimensões de 0,5 x 0,5 m, avaliando-se a população das pragas presentes e classificando-as em espécies e danos causados. A segunda forma é aquela efetuada nos meses mais frios e secos no ano (maio a agosto para a região Centro-Sul), observando-se e mapeando-se os focos com sintoma de secamento causado pelas larvas de Migdolus spp. Esse modo de monitoramento é pouco eficiente no caso de áreas com baixas a médias infestações, uma vez que os sintomas descritos não se tornam visíveis. Uma terceira forma de monitoramento, bastante prática, é a instalação de armadilhas no nível do solo contendo o feromônio sexual sintético de M. fryanus. Recomenda-se utilizar no mínimo uma armadilha para cada 10 hectares a partir do início das chuvas (outubro/novembro) até o final das revoadas (fevereiro/março), efetuando-se a troca do feromônio cada 30 dias. As formas de levantamento mencionadas servem de base para o mapeamento e a recomendação de controle onde for constatada a presença das formas biológicas da praga. A decisão de adotar o controle químico ocorrerá em função do custo dos produtos, do histórico de produtividade e da situação e da situação de risco pela população da praga presente na área.

Controle químico

O controle de Migdolus é difícil. Recomenda-se atualmente o uso de fipronil (500 g/ha) ou do endosulfan (12 L/ha) ou do imidacloprid (2 L/ha) no sulco de plantio visando as larvas. Caso o inseto venha a ocorrer em cortes subseqüentes, recomenda-se a aplicação na soca do fipronil (300 g/ha) ou do imidacloprid (1,5 Lha).

Controle por comportamento

Embora poucos estudos tenham sido conduzidos com o feromônio sexual, existem boas perspectivas para a coleta massal de M. fryanus, considerando-se que o período de acasalamento é restrito a alguns dias do ano. Esse período é crítico para a sobrevivência desse inseto e, se interrompido, pode afetar sua nova geração. Para tanto, as áreas devem ser monitoradas com feromônio sexual a partir do início das chuvas a cada ano (outubro/novembro para a região Centro-Sul do Brasil). Com o início das revoadas, armadilhas devem ser instaladas a 30 m uma das outras nos carreadores principais, com o propósito de coletar o maio número de machos na área. Estudos preliminares indicam que é possível reduzir gradativamente, ano a ano, a população de M. fryanus nas áreas afetadas. Em Teodoro Sampaio – SP, utilizando-se essa metodologia por meio de mais de 5 mil armadilhas durante três safras consecutivas de cana-de-açúcar entre os anos de 1995 a 1998, conseguiu-se reduzir em mais de dois terços a população de M. fryanus nas áreas afetadas.

Controle mecânico e cultural

Práticas mecânicas e culturais têm sido de grande utilidade na redução populacional ou na melhoria da cultura sob o ataque de Migdolus spp. Como correta destruição das soqueiras de cana (reforma), incorporação de matéria orgânica e adubação verde. Na correta destruição de soqueiras de cana-de-açúcar (reforma), dois aspectos importantes devem ser considerados: a época de execução do trabalho e os implementos a serem utilizados. Estudos de dinâmica populacional de M. fryanus demonstraram que a época na qual a maior porcentagem de larvas se encontra no primeiros 20-30 cm do solo coincide com os meses mais frios e secos do ano para a região Sudeste, ou seja, de março a agosto. Desse modo, do ponto de vista de controle, a destruição das soqueiras de cana-de-açúcar, quando efetuada nessa época, mesmo que parcialmente, é muito mais efetiva. Esse método de controle, apesar de eficiente, não atinge as larvas que porventura estejam abaixo dos 20-30 cm. Além disso, só é efetuado nos canaviais que necessitam de reforma ou que foram inviabilizados economicamente devido ao intenso ataque desse inseto. Embora esse método seja muitas vezes necessário para reduzir a população de larvas de Migdolus spp. no campo, deve-se atentar para o fato de que o uso de determinados implementos promove maior pulverização do solo, favorece sobremaneira o processo de erosão. Outro fator importante é o aumento de custo de produção (horas-máquinas, horas-homem, combustíveis) nas áreas que exigirem maior emprego desses implementos. Nesse contexto, é importante ressaltar a inconveniência do emprego do cultivo mínimo nas áreas infestadas por Migdolus spp.

Referência consultada

GALLO, D. et al. Entomologia Agrícola. FEALQ, Piracicaba, 920 p., 2002.

PINTO, A.S. 2006. Controle de pragas da cana-de-açúcar. Boletim Técnico Biocontrol, 64 p., 200.

Autor: Luis Garrigós Leite, Instituto Biológico
E-mail: luis.leite@sp.gov.br

 
Publicado em: 19/04/2016
Atualizado em: 19/04/2016
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