Sexta-Feira, 26 de Abril de 2024
Complexo do lenho rugoso da videira (Grapevine rupestris stem pitting-associated virus (GRSPaV), Grapevine virus A (GVA) e Grapevine virus B (GVB))

Hospedeiros: Vitis vinifera e V. labrusca (Vitaceae) - videira

Agente causal: Grapevine rupestris stem pitting-associated virus (GRSPaV), Grapevine virus A (GVA) e Grapevine virus B (GVB)

Etiologia: Quatro viroses constituem o complexo do lenho rugoso da videira (Grapevine rugose wood complex), podendo causar alterações no lenho de plantas infectadas e prejudicar a formação dos vasos condutores da seiva:
(i) o intumescimento dos ramos (Corky bark);
(ii) as caneluras do tronco de Rupestris (Rupestris stem pitting);
(iii) a acanaladura do lenho de Kober (Kober stem grooving); 
(iv) a acanaladura do lenho de LN33 (LN33 stem grooving).
As três últimas viroses mencionadas são genericamente conhecidas por “caneluras do tronco da videira”. Estas viroses podem ser identificadas por meio de testes biológicos constituídos de enxertia em cultivares indicadoras sensíveis (Rupestris du Lot, Kober 5BB e LN33), específicas para cada vírus.

O agente causal do Intumescimento dos ramos da videira é o Grapevine virus B (GVB), pertencente ao gênero Vitivirus, família Betaflexiviridae. As partículas são alongadas e flexuosas com 760 nm de comprimento e 12 nm de diâmetro, possui genoma constituído de RNA fita simples com 7599 nucleotídeos e organizado em 5 ORF (fase aberta de leitura). Com certa dificuldade, o GVB pode ser transmitido mecanicamente para Nicotiana occidentalis e outras hospedeiras herbáceas.

Os vírus Grapevine rupestris stem pitting-associated virus (GRSPaV) e Grapevine virus A (GVA), pertencentes à família Betaflexiviridae e aos gêneros Foveavirus e Vitivirus, respectivamente, são os agentes causais das viroses Caneluras do tronco de Rupestris e Acanaladura do lenho de Kober, respectivamente. O agente causal da Acanaladura do lenho de LN33 ainda não foi determinado. GRSPaV e GVA apresentam partículas alongadas e flexuosas com 725-800 nm de comprimento e diâmetro de 12 nm. O genoma viral possui 8744 (GRSPaV) e 7351 (GVA) nucleotídeos, formado por um RNA fita simples com 5 ORF. O GRSPaV não é transmitido mecanicamente via inoculação com extrato foliar e não possui inseto vetor conhecido. O GVA pode ser transmitido mecanicamente para algumas hospedeiras herbáceas a exemplo de Chenopodium quinoa e Nicotiana spp. Um vírus, filogeneticamente relacionado ao GVA, foi detectado infectando maracujazeiro (Passiflora alata) no Brasil.

Outro vírus pertencente à família Betaflexiviridae e ao gênero Vitivirus, o Grapevine virus D (GVD), também já foi detectado infectando videiras no Brasil. Apesar de o GVD ter sido detectado em videiras exibindo tecidos com aspecto de cortiça, o seu papel como constituinte do complexo do Lenho rugoso da videira ainda é pouco compreendido, bem como, sua importância econômica e os aspectos epidemiológicos desse vírus. Outros vitivírus (GVE e GVF) também foram recentemente identificados infectando videiras.

Diversos isolados brasileiros de GRSPaV, GVA, GVB e GVD foram caracterizados molecularmente, por meio da obtenção e análise das sequências de nucleotídeos do gene da proteína capsidial, determinando-se a variabilidade genética e o relacionamento filogenético entre tais isolados e isolados homólogos estrangeiros.

Sintomas: Nas cultivares americanas (V. labrusca), os sintomas induzidos pelo GVB se caracterizam pelo intumescimento dos entrenós do ramo do ano, com rachaduras longitudinais no tecido afetado. Estes sintomas podem ser observados também no pecíolo das folhas próximas às regiões afetadas dos ramos. Com o amadurecimento do ramo, o tecido da região intumescida fica com um aspecto corticento. Os ramos afetados são destacados da planta com facilidade, principalmente quando há formação de tecido corticento na região de sua inserção. Nas plantas muito afetadas, a brotação é atrasada e menos vigorosa. As folhas tendem a enrolar os bordos para baixo, além de caírem mais tardiamente no outono. A planta definha gradativamente, com seca parcial ou total dos ramos afetados, podendo morrer em poucos anos. Em algumas cultivares viníferas (V. vinifera) e híbridas pode ser observado avermelhamento intenso nas folhas, em cultivares tintas, ou amarelecimento e enrolamento dos bordos foliares, em cultivares brancas, que se evidenciam no outono. Outro sintoma associado ao GVB, em mudas, é o engrossamento na região da enxertia. Nestes casos, verifica-se a formação excessiva de tecido de consistência esponjosa na região da enxertia. O tecido, quando maduro, adquire aspecto corticento e apresenta rachaduras longitudinais.

Em cultivares sensíveis, caneluras podem ser observadas sob a casca do tronco da videira na superfície do lenho. As caneluras correspondem ao local onde a casca penetra no tronco, prejudicando a formação dos vasos condutores da seiva. As plantas doentes, em geral, apresentam diminuição do vigor e há atraso na brotação das gemas. A casca do tronco é mais grossa e de aspecto corticento. Em algumas combinações enxerto/porta-enxerto, os sintomas podem ser restritos a um dos componentes, quando o outro é tolerante. Os porta-enxertos, em especial o Paulsen 1103, normalmente mostram sintomas nítidos da doença. Muitas cultivares viníferas e americanas são altamente suscetíveis. As caneluras podem ser observadas até nas raízes, especialmente em cultivares muito suscetíveis, como o porta-enxerto Rupestris du Lot. Também pode ocorrer na região da enxertia uma diferença de diâmetro entre o enxerto e o porta-enxerto. As folhas das cultivares tintas podem apresentar avermelhamento, em função da formação anormal dos vasos condutores na região afetada. A morte de plantas pode ocorrer em até 10 anos ou mais cedo, quando ambas as cultivares (porta-enxerto e enxerto) são sensíveis. Em algumas cultivares a doença pode permanecer em estado latente.

Importância: A virose do intumescimento dos ramos, nas cultivares americanas Isabel, Niágara Rosada e N. Branca, induz queda progressiva de produtividade, a uva não completa a maturação, há redução no teor de açúcar da fruta e a planta pode morrer em poucos anos. Em cultivares de V. vinifera, a presença do GVB, associada ao sintoma de engrossamento na região da enxertia, causa a morte precoce de mudas após a enxertia.

Na virose das caneluras do tronco, a severidade dos sintomas depende da combinação copa produtora x porta-enxerto, suscetibilidade das cultivares e isolado ou estirpe viral. Nas combinações mais sensíveis, a doença causa o declínio e subsequente morte da planta, que pode ocorrer poucos anos após a infecção viral. O declínio sempre é acompanhado de progressiva redução da quantidade e qualidade da produção até a improdutividade total da planta.

Ocorrência: O intumescimento dos ramos ocorre na maioria dos países vitícolas, afetando muitas cultivares comerciais de produtoras e de porta-enxertos, algumas vezes sem que estas apresentem sintomas. A virose das caneluras do tronco é conhecida na maioria das áreas vitícolas do mundo, sendo que a incidência da doença depende da suscetibilidade da cultivar, da idade do vinhedo e da origem do material propagativo. No Brasil, em recentes levantamentos conduzidos em algumas das principais regiões vitícolas, se constatou que a ocorrência de sintomas destas viroses é frequente. A incidência de três vírus associados à virose, em três regiões vitícolas dos Estados de São Paulo e Pernambuco, foi de 61-100% (GVA), 2-28% (GVB) e 35-80% (GRSPaV).

Manejo: A disseminação de longa distância dessas viroses ocorre por meio do material vegetativo infectado e a transmissão através de enxertia. Assim a principal forma de controle é a utilização de material propagativo sadio, livre de vírus. A disseminação natural do GVA e GVB em vinhedos ocorre pela atuação de vetores. Tanto o GVA quanto o GVB podem ser transmitidos por diversas espécies de cochonilhas farinhentas da família Pseudococcidae (Heliococcus bohemicus, Phenacoccus aceris, Planococcus citri, Pl. ficus, Pseudococcus viburni, Ps. comstocki, Ps. affinis, Ps. longispinus, Neopulvinaria innumerabilis) e por cochonilhas de carapaça, família Coccidae (Parthenolecanium corni). O monitoramento e o controle destas cochonilhas devem ser considerados visando-se redução da disseminação dos vírus por elas transmitidos. Em relação ao GRSPaV não há vetor conhecido, entretanto, foi confirmada a presença deste vírus em sementes de videira, inclusive, resultando em plântulas infectadas. Isto não constitui significativo problema, visto que a propagação comercial da videira é realizada com a utilização de material vegetativo. Não há registro científico da transmissão desses vírus de uma videira a outra através de tesoura de poda ou ferramentas de cultivo.

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Autores: Thor Vinícius Martins Fajardo, Embrapa Uva e Vinho; Marcelo Eiras, Instituto Biológico
E-mail
: thor.fajardo@embrapa.br; marcelo.eiras@sp.gov.br

 
Publicado em: 06/09/2016
Atualizado em: 21/09/2016
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