Sábado, 11 de Maio de 2024
Bicudo da cana (Sphenophorus levis)

O bicudo-da-cana-de-açúcar, Sphenophorus levis (Vaurier, 1978) (Coleoptera: Curculionidae), é uma importante praga dos canaviais no estado de São Paulo. As larvas desse inseto destroem rizoma da planta, causando prejuízos da ordem de 30 toneladas de cana por hectare, além de reduzir a longevidade do canavial.

Ocorrência: o gênero Sphenophorus ocorre em diversos países, de vários continentes, abrangendo um complexo de espécies que danificam culturas de importância econômica do grupo das gramíneas. Somente nos EUA ocorrem mais de 64 espécies desse gênero, sendo que 20 já foram registradas na Flórida. Diversas espécies são encontradas também em países da América do Sul, tendo sido descritas 14 espécie no Brasil, incluíndo S. levis que foi descrita como espécie nova em 1978.

Importância: a importância de S. levis como praga da cana-de-açúcar no Brasil somente foi conhecida a partir de 1977, sendo que 1989 o inseto foi detectado em 14 municípios ao redor de Piracicaba causando a morte de 50-60% dos perfilhos ainda na fase de cana-planta, com cinco a sete meses de crescimento. Atualmente, S. levis encontra-se distribuído em mais de 53 municípios, incluindo as regiões Central (Araraquara, São Carlos, Jaú, etc.); Sul (Assis, Ourinhos); Nordeste (Pradópolis) e Leste (Leme, Pirassununga, Araras, São João da Boa Vista, Santa Cruz das Palmeiras, etc.), estando portanto em quase todas as regiões de cultivos de cana-de-açúcar do estado de São Paulo. O bicudo-da-cana tem uma capacidade de vôo restrita, sugerindo que a dispersão do inseto a longas distâncias dá-se através das mudas retiradas de local infestado. Os adultos caminham lentamente possibilitando a sua dispersão de um talhão para outro vizinho.

Bioecologia: as fêmeas inserem os ovos na base de brotações, abaixo do nível do solo, após perfurarem os tecidos sadios do rizoma com as mandíbulas presentes no ápice do rostro ou bico. Após 7 a 12 dias de incubação dos ovos, as larvas eclodem e passam a escavar galerias no interior e na base da planta ao se alimentarem, que permanecem cheias de serragem fina. O desenvolvimento das larvas dá-se em um período médio de 50 dias, sendo que no final dessa fase o inseto prepara uma câmara com a serragem, e trasforma-se em pupa no ser interior. Após 7 a 15 dias, emergem os adultos que permanecem no solo, sob torrões e restos vegetais ou entre os perfílhos, nas bases das touceiras. A longevidade média dos adultos é de 203 dias para os machos e 224 dias para as fêmeas, com cada fêmea colocando ao longo desse período cerca de 40 ovos, podendo chegar a 60–70 ovos. Ocorrem dois picos populacionais para os adultos, sendo um menor no mês de outubro ou novembro, e o principal em março. Para larvas, também ocorrem dois picos populacionais: um em dezembro e outro, de maior intensidade, em junho-julho. Esses dados sugerem a ocorrência de duas gerações anuais da praga, em épocas bem definidas.

Danos e sintomas: os danos são causados pelas larvas que se abrigam no interior do rizoma e danificam os tecidos. Em consequência pode ocorrer a morte da planta e falhas nas brotações das soqueiras, com perdas de 20 a 30 toneladas de cana/ha/ano. Os seguidos ataques nas áreas de soqueiras e a consequente redução do "stand" da cultura ocasionam perdas cumulativas nos cortes, obrigando a reformas precoces do canavial, que muitas vezes não passam do segundo corte.

Controle químico, mecânico e cultural: no controle desse inseto tem sido recomendado um conjunto de medidas que consiste na destruição mecânica da soqueira na época apropriada; a manutenção da área destruída livre de vegetação hospedeira por um período prolongado (> 3 meses); a aplicação no sulco de plantio do inseticida fipronil 800 WG (250 g/ha) ou thiametoxam 250 WG (0,8 a 1,5 Kg/ha); e o uso de iscas tóxicas. O uso de iscas tóxicas tem mostrado certa eficiência no controle de adultos. As iscas são confeccionadas com cana cortadas ao meio (30 cm de comprimento) e previamente tratadas com inseticidas (mistura de 25 g de carbaril 850 PM com 1 L de água e 1 L de melaço) e distribuídas na quantia de 100 a 120 iscas/ha.

Entretanto, apesar de todas essas medidas, ainda tem ocorrido um incremento nas populações da praga, sendo frequente, nos últimos anos, registros de novas áreas infestadas. Isso demonstra a dificuldade de controle desse inseto, ressaltando a importância da continuidade de pesquisas na busca de alternativas mais eficazes, sem poluir o meio ambiente.

Controle biológico: alguns trabalhos utilizando os fungos Beauveria bassiana e Metarhizium anisopliae em associação com iscas feitas de tolete de cana (semelhante as iscas empregadas no controle químico) tem mostrado resultados promissores desses microrganismos no controle de Metamasius hemipterus e de S. levis. A utilização de toletes de cana tem a vantagem de atrair adultos para um local com grande concentração de inóclo, protegido de fatores abióticos indesejáveis, favorecendo assim o controle dos insetos com baixa dosagem dos fungos por hectare.

Nos EUA e Japão, algumas espécies de Sphenophorus são pragas importantes em gramados, sendo eficientemente controladas pelo uso de nematóides entomopatogênicos. O nematóide S. carpocapsae, na dosagem de 2,5 x 109 juvenis infectivos/ha, proporcionou níveis de controle variáveis de 70,4 a 91,2% para S. purvulus em estudos realizados nos Estados Unidos, e de 77,3 a 96,2% para Sphenophorus venatus em testes no Japão. Já a espécie H. bacteriophora, na mesma dose, foi um pouco menos eficiente para S. purvulus, proporcionando níveis de controle variáveis de 67,0 a 84,1%. Todos os estágios imaturos desses insetos são suscetíveis aos dois nematóides, o mesmo ocorrendo com os adultos de S. venatus em relação a S. carpocapsae. Nematóides entomopatogênicos associam-se por simbiose a bactérias, e invadem o corpo do hospedeiro liberando esses microorganismos que causam a morte rápida do inseto. Os nematóides alimentam-se intensamente da bactéria e dos tecidos do inseto morto, reproduzindo-se por várias gerações. Consequentemente, com o fim do alimento, milhares de nematóides conhecidos com juvenis infectivos, deixam o cadáver do inseto na busca de novos hospedeiros.

Entre as razões para uso comercial de nematóides, pode-se citar: 1) possibilidade de produção massal in vitro e formulação a custos tidos como economicamente viáveis; 2) específicos para inseto, com comprovada eficiência no controle de certas espécies, em especial das chamadas pragas de solo ou que passam parte do ciclo biológico no solo; 3) em muitos casos, comportamento de busca do hospedeiro; 4) persistência por longos períodos no ambiente; 5) não toxicidade ao homem ou a animais domésticos e de interesse zootécnico; e 6) isenção de registro dos produtos biológicos formulados à base de nematóides junto a Environmental Protection Agency (EPA), nos Estados Unidos, ou a organismos congêneres em vários outros países.

Autor: Luis Garrigós Leite, Instituto Biológico
E-mail: luis.leite@sp.gov.br

 
Publicado em: 10/04/2016
Atualizado em: 19/04/2016
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